sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

Justiça reconhece direito de outorga do título de domínio de comunidade quilombola em área do Petar

Justiça reconhece direito de outorga do título de domínio de comunidade quilombola em área do Petar

Decisão da Vara Única de Eldorado. 

 

A Vara Única da Comarca de Eldorado reconheceu a invalidade material de parte do Decreto 32.238/58, que criou o Parque Estadual do Alto Ribeira (Petar) e incorporou ao perímetro do parque a região onde está localizado o território do Quilombo Bombas. Pela decisão, o domínio da propriedade passa a ser da comunidade que ocupa a região há mais de 300 anos. A sentença, proferida pela juíza Hallana Duarte Miranda, determinou, ainda, que o Estado de São Paulo e a Fundação Florestal apresentem projeto e cronograma de execução da estrada de acesso à região e iniciem a obra em até um ano a contar da data de apresentação do projeto, justificando que se trata de comunidade com alto grau de isolamento. 
A Defensoria Pública de São Paulo ingressou com ação civil pública solicitando que o Estado realizasse a regularização fundiária da região, argumentando que a comunidade já estava no local quando o parque foi criado e que teria direito à titulação do território, conforme previsão Constitucional no artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias
Em sua decisão, a juíza destacou, que, como uma Unidade de Conservação (como é o caso do Petar) só pode ser diminuída por meio de lei, haveria duas possibilidades para o caso em questão: interpretar que o decreto que criou o Petar é inteiramente válido e que há coexistência de uso com a Comunidade de Bombas, sendo que os quilombolas não teriam direito à propriedade da terra (tese de dupla afetação); ou interpretar que o decreto é parcialmente inválido na parte em que se sobrepõe ao Quilombo de Bombas (tese de invalidade), mantendo a sua integral validade na parte remanescente. 
De acordo com a magistrada, a tese de invalidade é a única que detém sustentação jurídica, uma vez que cumpre o previsto na Constituição Federal (que garante aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras a propriedade definitiva) e não subverte a ideia de domínio ou enfraquece o único direito previsto para as comunidades quilombolas. “É de se aplicar ao caso a compreensão de que o Decreto que cria o Petar foi recepcionado apenas parcialmente, perdendo validade na parte em que se sobrepõe ao território de Bombas. Única possibilidade aceitável neste caso é a preservação máxima de ambos, a fim de não vulnerar o Parque e não invalidar o art. 68 do ADCT”, escreveu.
Em relação à dupla afetação, a juíza afirmou não ser possível acolher o entendimento, uma vez que o direito à propriedade de suas terras é garantido aos quilombolas pela CF. “Admitir a dupla afetação para os quilombolas é invalidar o próprio artigo 68 do ADCT. E é inadmissível, porque não foi reservado ao magistrado a possibilidade de discordar de um artigo e manipulá-lo interpretativamente a fim de modificar por completo o sentido atribuído pelo próprio constituinte”, concluiu.  

Para a magistrada, invalidar inteiramente o Decreto violaria o bem jurídico que se busca proteger, o meio ambiente, mas reconhecer a sua total validade implicaria em negar direito constitucionalmente garantido, o domínio à Comunidade.  

Cabe recurso da decisão. 

 

Processo nº 0000522-11.2014.8.26.0172 

 

Comunicação Social TJSP – GC (texto) / Banco de imagens (foto)
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