TJGO – Banco é condenado pela Justiça a recalcular dívida de cartão de crédito
O Banco B. S/A foi condenado a
recalcular uma dívida de sete anos, que já superou em três vezes o valor
inicial. Conforme sentença do juiz Leonardo Naciff Bezerra, a
instituição financeira não foi transparente ao oferecer, em vez de um
empréstimo consignado, um saque de cartão de crédito com desconto em
folha de pagamento. Por causa da indução a contratar a modalidade mais
onerosa ao consumidor, a instituição financeira terá de pagar R$ 8 mil
por danos morais ao correntista.
Em 2010, J. R. celebrou contrato de empréstimo no valor de R$ 4.500, a
serem pagos em parcelas mensais de R$ 270. Contudo, o valor era pago,
sem atingir a totalidade da dívida. Ao analisar o processo, o magistrado
constatou que a instituição financeira ofereceu um saque de cartão de
crédito ao cliente, no qual se abatia, mensalmente, apenas o valor
mínimo da fatura, impedindo a liquidação da dívida, que aumentava
“vertiginosamente com o passar do tempo”.
Para Naciff Bezerra, o banco “violou os princípios da probidade e
boa-fé, o que impõe a adequação do contrato em questão reconhecendo-o
como contrato de mútuo com consignação em folha de pagamento, e não de
saque com cartão de crédito, permitindo aplicar ao caso as diretrizes
traçadas para o empréstimo consignado, em relação aos encargos
pertinentes”.
Até o momento atual, J. já havia pago mais de R$ 13 mil. Na sentença,
o magistrado fixou os juros remuneratórios em 2,34%, conforme Tabela do
Banco Central, afastando a incidência de capitalização mensal. Com o
novo cálculo, caso seja apurado que a parte autora pagou mais do que
deveria, o B. deverá restituir a vítima em dobro da quantia apurada além
da conta.
Modalidade perigosa
Na petição, J. alegou que sua intenção, ao contrair o empréstimo, era
celebrar o crédito consignado com desconto em folha de pagamento, e não
o saque de um cartão de crédito. Sobre isso, o juiz ponderou que “o
banco réu faltou informar ao autor, de forma clara e específica, de que
os descontos se dariam sobre o valor mínimo da fatura”.
Tal modalidade de dívida é, na ótica de Naciff Bezerra, desleal com o
cliente. “É de fácil percepção a proliferação deste tipo de demanda, na
qual o consumidor imagina que celebrará um contrato de empréstimo
(mútuo feneratício), enquanto na verdade se cuida de um contrato atípico
de cartão de crédito”.
Para embasar a sentença, o juiz destacou que o Banco Central do
Brasil (Bacen), notando o grande endividamento condizente com esse tipo
de operação, lançou a
Circular nº 3549/11
em 2011, que equipara o cartão de crédito consignado às demais
operações de consignado “para desestimular as operações de financiamento
consignado no cartão com prazos longos e preservar os objetivos
prudenciais da regulamentação”.
Sobre o assunto, o
Código de Defesa do Consumidor
(CDC) – em seu artigo 6º, inciso 3 – dispõe que é direito básico do
consumidor a informação clara, adequada, com especificação correta,
visando preservá-lo nos negócios jurídicos submetidos ao crivo da norma
consumerista. Tal exigência também decorre de um dos deveres anexos do
princípio da boa-fé objetiva, prevista no artigo 422 do
Código Civil.
O magistrado elucidou que a legislação “procura adequar o princípio
da livre manifestação de vontade à natureza própria da relação de
consumo, no qual o consumidor encontra-se em situação de flagrante
vulnerabilidade técnica, econômica e jurídica”.
A abusividade do cartão de crédito é tamanha, segundo destacou o
juiz, “que houve a suspensão dos empréstimos consignados em Goiás, cuja
medida fora tomada pelo Procon-GO e Secretaria de Gestão e Planejamento
(SegPlan), seguindo recomendação do Ministério Público”.
Diante desse quadro, em que práticas abusivas são verificadas, “o
Judiciário, valendo-se do sistema protetivo inaugurado pelo CDC, deve
intervir nos contratos privados, definindo regras de equidade, com o
objetivo de implantar ou restabelecer o equilíbrio nas relações das
instituições financeiras com seus clientes, quando, em desvantagem
exagerada destes, aquelas estejam se locupletando ilicitamente”.
Fonte: Tribunal de Justiça de Goiás/AASP