TRF-3ª – SUS deve fornecer medicamento sem registro na Anvisa para tratamento de hepatite C crônica
Para magistrados, poder público não
poder negar tratamentos excepcionais e urgentes quando a vítima da
doença não tem condição econômica
O Sistema Único de Saúde (SUS) deve fornecer medicamentos sem
registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a um
paciente de São Vicente (SP) que sofre de Hepatite C crônica. A decisão é
da Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) e segue
entendimento das Turmas do Supremo Tribunal Federal (STF) no sentido de
que o Judiciário pode ordenar o fornecimento de medicação que esteja
fora do acervo do SUS conforme a necessidade do doente.
Após ter o pedido de tutela antecipada indeferido na primeira
instância, o paciente interpôs agravo de instrumento sob o fundamento de
que é portador de doença Hepatite C crônica, com fibrose leve e
insuficiência renal crônica, necessitando do medicamento prescrito pelo
médico para evitar o agravamento da doença.
Ao conceder o pedido no TRF3, o relator do processo, desembargador
federal Johonsom Di Salvo, salientou que a responsabilidade pelo
fornecimento do medicamento de que necessita a parte decorre do direito
fundamental dela à vida e a uma existência digna, na qual um dos pilares
é a saúde, cuja preservação também é atribuída aos poderes públicos
executivos da União, dos Estados e dos Municípios, todos eles solidários
nessa obrigação.
“Não se pode permitir que os entes públicos se neguem a custear
tratamentos excepcionais e urgentes quando a vítima da moléstia não tem
condições econômicas de os suportar, porquanto isso implicaria
simplesmente na negativa do direito fundamental à saúde e à vida,
consagrados na atual Constituição Federal”.
Para o magistrado, o acesso à saúde compreende além da
disponibilização por parte dos entes públicos de hospitais, médicos,
enfermeiros etc., também procedimentos clínicos, ambulatoriais e
medicação conveniente.
“E pouco importa se eles estão ou não disponibilizados em algum
programa específico dos órgãos governamentais, já que a burocracia
criada por governantes não pode privar o cidadão do mínimo necessário
para a sua sobrevivência quando ele mais necessita: quando está
efetivamente doente”.
Na decisão, Johonsom Di Salvo afirma que há prova suficiente,
presente no laudo médico assinado pelo Gastroenterologista e
Hepatologista da Casa da Hepatite da Universidade Metropolitana de
Santos, que descreve com detalhes a situação do paciente e conclui pela
oportunidade e conveniência do fornecimento do medicamento solicitado.
No entendimento do magistrado, pela excepcionalidade do caso, não é
possível negar o pedido pela ausência de registro do medicamento junto à
Anvisa.
“Negar à parte agravante o medicamento necessário ao tratamento
médico pretendido implica desrespeito as normas constitucionais que
garantem o direito à saúde e à vida; mais: ofende a moral administrativa
(art. 37 da
Constituição), pois o dinheiro e a conveniência dos detentores temporários do Poder não sobreleva os direitos fundamentais”.
A decisão segue jurisprudência do STF e do STJ no sentido de
reconhecer que os portadores de moléstias graves, que não tenham
disponibilidade financeira para custear o seu tratamento, têm o direito
de receber gratuitamente do Estado os medicamentos de comprovada
necessidade.
O magistrado também ressalta que ao decidir sobre tratamentos de
saúde e fornecimento de remédios o Poder Judiciário não está se
investindo da função de co-gestor do Poder Executivo. Segundo ele, está
dando efetividade ao art. 6º, inc. I, “d”, da
Lei nº. 8.080/90 que insere no âmbito da competência do SUS a assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica.
Por fim, o desembargador federal afirma que limitar o atendimento a
Relação Nacional de Medicamentos Essenciais/ RENAME criada pelo
Ministério da Saúde e aos limites orçamentários do Poder Público é
colidir diretamente contra o direito à vida, contra o direito social de
integridade do acesso à saúde e contra a essencial dignidade da pessoa
humana.
“A propósito da questão de estar ou não o medicamento inserido em
atos normativos do SUS, destaca-se que muito recentemente o Supremo
Tribunal Federal/STF marcou posição no sentido de que ‘a lista do SUS
não é o parâmetro único a ser considerado na avaliação da necessidade do
fornecimento de um medicamento de um caso concreto, que depende da
avaliação médica’”.
Com esse entendimento, o colegiado antecipou a tutela recursal e
determinou o fornecimento do medicamento – na forma como solicitado pela
parte autora/agravante – a partir do 5º dia útil subsequente a
intimação de seu representante judicial.
Agravo de Instrumento 0021001-60.2016.4.03.0000/SP
Fonte: Tribunal Regional Federal da 3ª Região/AASP