15 anos: Atuação do CNJ ampliou atribuições e efetividade de cartórios
24 Jun, 14:33
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De símbolo da morosidade burocrática a
referência internacional em eficiência e capilaridade, os cartórios
brasileiros evoluíram juntamente com o Conselho Nacional de Justiça
(CNJ) ao longo dos últimos 15 anos. Ciente da importância dessa
prestação de serviço à população brasileira e da necessidade de
profissionalizar o atendimento, o CNJ começou a reorganizar o sistema
cartorial logo no primeiro ano de seu funcionamento. Hoje, a ampliação
das atribuições das serventias extrajudiciais repercute positivamente na
vida do cidadão e das instituições públicas e privadas brasileiras.
Os cartórios têm a incumbência de dar publicidade, atestar a
autenticidade e garantir a segurança e eficácia a todos os atos
jurídicos praticados no país. É um cartório de registro civil que emite,
por exemplo, certidões de nascimento e casamento, acordos pré-nupciais,
adoção, registro de óbito, reconhecimento de paternidade, interdição,
opções de nacionalidade e emancipação de menores. A vida de empresas e
outras sociedades civis, religiosas, morais, científicas e literárias e,
ainda, fundações e associações de utilidade pública também é registrada
por cartórios. Nesses casos, são os cartórios de registro civil de
títulos e das pessoas jurídicas que registram contratos, atos
constitutivos, estatuto e outros compromissos.
Já os cartórios de notas dão fé pública a documentos por meio da
emissão de escrituras, procurações e testamentos e pelos procedimentos
de reconhecimento de firma e autenticação de cópias. Outro tipo de
cartório, também regulado pelo CNJ, é o de registro de imóveis, responsável
pela matrícula, registro e averbação de atos relativos a terrenos e
construções em todo o Brasil. Nos tabelionatos de protestos, é dada
publicidade sobre a inadimplência de uma obrigação e são protocolados os
documentos dessas dívidas, intimados os devedores, recebidos
pagamentos, lavrado o protesto em caso de não quitação e expedidas
certidões relativa a dívidas.
A despeito de sua importância, em 2005, a realidade cartorial
brasileira era bem diferente da atual. As serventias extrajudiciais que
funcionavam no país eram consideradas, na prática, bens de família
passados, na maioria das vezes, de pai para filho. Sem a centralização
do controle e com investimento tecnológico aquém do necessário, os
cartórios também eram muitas vezes apontados como cúmplices de ações
fraudulentas e desvios de dinheiro.
O primeiro passo tomado pelo CNJ nesta área foi a edição da Resolução n. 7/2005,
que proibiu donos de cartório de contratar parentes de magistrados que
exerçam atividade de fiscalização dos serviços extrajudiciais e parentes
de qualquer desembargador de tribunal de Justiça do estado onde se
localizam os serviços extrajudiciais. Garantia-se, assim, a fiscalização
idônea e caminhava-se rumo à profissionalização do sistema.
Da herança aos concursos
Outro obstáculo enfrentado pelo CNJ foi a hereditariedade das
serventias, algo que começou ainda na época do Brasil Império. Porém, em
1988, a Constituição Federal apresentou, no parágrafo 3º do artigo 236,
novo caminho para o ingresso na atividade notarial e de registro: a
aprovação em concurso público. Isso porque, de acordo com a Carta Magna,
os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado,
mas por delegação do poder público.
Somente em 2009, por determinação do CNJ, a norma se concretizou. Naquele ano, a Resolução CNJ n. 80 declarou
a vacância de todos os serviços notariais e de registro ocupados em
desacordo com as normas constitucionais. A medida resultou na
destituição de 5,5 mil dos 14 mil cartorários de suas funções. A Resolução n. 81, em seguida, já trouxe as regras para a realização dos concursos para outorga de cartórios extrajudiciais.
“Naquela época, ano de 2008, as serventias extrajudiciais eram uma
bagunça”, relembrou o ministro aposentado do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) e ex-corregedor nacional da Justiça Gilson Dipp. Ele foi o
relator da Resolução n. 80 e da n. 81 do CNJ. “Era um tal de tio passar
o cartório para o sobrinho, para primo, para quem quisesse. Não tinha
nenhum regramento”, contou. De acordo com o ex-corregedor, a mudança era
necessidade urgente e foi um trabalho em equipe de todos os
conselheiros do CNJ na época, com especial apoio do então presidente do
CNJ ministro Gilmar Mendes.
Na época, cerca de 80% dos processos que tramitavam no CNJ eram
relacionados a problemas cartoriais. “Pegamos a Constituição Federal e
outras leis e redigimos as resoluções. Houve muita resistência não
apenas dos donos de cartórios, mas também de alguns tribunais”, afirma
Dipp, lembrando que, quando declarou a vacância das serventias, sofreu
mais de mil mandados de segurança. “No final, prevaleceu a moralidade, a
impessoalidade e o interesse público”, avaliou.
Para ampliar a transparência para a sociedade e expor a realidade das
serventias extrajudiciais brasileiras, desde 2008, o CNJ publica, em
sua página na internet, os dados financeiros e administrativos dos
cartórios por meio do Sistema Justiça Aberta. Essa decisão permitiu ainda afinar políticas públicas destinadas ao segmento.
Informatização
A informatização e uniformização das serventias extrajudiciais também
teve a participação do CNJ por meio da Corregedoria Nacional de
Justiça. Entre 2017 e 2018, uma equipe especializada realizou vistorias
em todos os estados e observou que alguns cartórios operavam sem nenhum
sistema de segurança de dados. Alguns usavam, por exemplo, softwares piratas e internet intermitente, além da vulnerabilidade ao ataque de hackers em busca de informações preciosas.
Este trabalho subsidiou a edição do Provimento n. 74 de 2018,
que traz os padrões mínimos de tecnologia exigidos para a prestação dos
serviços de notas e registros e a garantia da segurança da informação e
de atendimento ao cidadão. “Levamos em consideração desde o preço dos
equipamentos até o avanço tecnológico e a necessidade de se uniformizar a
manutenção dos arquivos eletrônicos, de forma a permitir que, no
futuro, os dados sejam compartilhados entre os cartórios com segurança”,
destaca o ex-juiz auxiliar da Corregedoria Márcio Evangelista Ferreira
da Silva, que coordenou os trabalhos.
Os avanços proporcionados pelo Provimento 74 permitiram que, hoje,
com a pandemia da Covid-19, os cartórios consigam cumprir a exigência de
trabalharem remotamente, por meio de ferramentas on-line. “Nada do que está sendo feito hoje seria possível se não tivéssemos publicado o provimento. Hoje temos um serviço on-line seguro para os atos eletrônicos”, afirmou.
O presidente da Associação dos Notários e Registradores (Anoreg),
Cláudio Marçal Freire, cita ainda a instituição dos provimentos
nacionais que regulamentaram as Centrais Eletrônicas como pilar da
transformação dos cartórios pela atuação do CNJ. As centrais congregam
serviços de Registro Civil, de Notas, de Títulos e Documentos e Pessoa
Jurídica, de Protesto e mais, recentemente, de Registro de Imóveis, por
meio do ONR – Operador Nacional do Sistema de Registro de Imóveis
Eletrônico (SREI). “A criação das centrais foi o grande impulso para a
migração dos serviços de notas e de registros para o meio eletrônico,
que se transformaram, como no caso do Protesto, em uma atividade 100%
digital”, relata.
Para Marçal Freire, os cartórios tiveram sua atividade transformada
com o advento da tecnologia, da desburocratização e da gestão da
qualidade na prestação de serviços e os resultados continuam a ser
incorporados ao segmento. Entretanto, ele destaca que alguns ainda
enfrentam os desafios impostos pela disparidade de realidades e a
magnitude continental do Brasil.
O cumprimento do Provimento n. 74 por cartórios de menor porte, por
exemplo, esbarrou na pouca infraestrutura municipal de algumas
localidades, baixa tecnologia e rendimento que, muitas vezes, impede o
titular da unidade de fazer os investimentos necessários. “O CNJ e a
Corregedoria Nacional de Justiça possuem grande parcela na construção
desse atual modelo notarial e registral, por dialogarem diariamente com
as entidades de classe dos setores e, a partir disso, tomar as decisões
regulamentadoras que libertaram muitas amarras que engessavam a
atividade”, completou.
Serviço social
A função social dos cartórios brasileiros também foi aperfeiçoada e
ampliada a partir da atuação do CNJ. Um exemplo disso é a vigência,
desde 2010, do Provimento n. 13,
que permitiu a emissão de certidão de nascimento nos estabelecimentos
de saúde que realizam partos. A medida contribuiu para reduzir o número
de registros tardios no país. “Para mim, foi uma facilidade enorme poder
registrar a minha filha já dentro do hospital, sem precisar ir a um
cartório”, contou Silvania da Silva Barros, que teve sua filha Joana –
hoje, com quatro anos – no Hospital Regional da Asa Norte (HRAN), em
Brasília.
Também com o intuito de garantir direitos e o exercício pleno da cidadania, o Provimento n. 16, de 2012,
disciplinou a recepção, pelos oficiais de Registro Civil das Pessoas
Naturais, da indicação de supostos pais de pessoas já registradas sem
paternidade estabelecida, bem como do reconhecimento espontâneo e tardio
de paternidade. Já em 2017, o Conselho editou o Provimento n. 63,
para disciplinar o reconhecimento e a averbação, em cartório, de
paternidade e maternidade socioafetiva. Isto permitiu, por exemplo, a
inclusão de padrasto e madrasta em certidões de filhos. Também, em
cartório, passou-se a se realizar a troca de nome e gênero de pessoas
transgêneros, conforme o Provimento n. 73/2018. Antes, a opção só era garantida para aqueles que tivessem em mãos uma sentença judicial.
Referência internacional
Mais profissionalizado e sob regras claras de gestão e controle, o
sistema de serventia extrajudicial brasileiro foi reconhecido
internacionalmente como uma referência. Em 2019, o Brasil sediou, pela
primeira vez, uma edição do International Forum on the eletronic
Aposlile Program (e-APP) da Conferência da Haia de Direito Internacional
Privado (HCCH). A recepção internacional foi fruto do trabalho
desenvolvido pelo CNJ e pelos cartórios brasileiros para desburocratizar
o serviço de apostilamento de documentos.
Antes da regulamentação do CNJ para a aplicação da Apostila da Haia,
um documento seria aceito por autoridades estrangeiras apenas depois de
seguidas legalizações em diferentes órgãos públicos no Brasil. Em 2016,
a Resolução CNJ n. 228/2016 delegou
às serventias extrajudiciais a tarefa de autenticar a documentação a
ser usada no exterior e, ao CNJ, o controle desses atos.
Para executar a tarefa da “legalização única”, o CNJ criou um sistema
digital chamado SEI-Apostila: basta ao interessado dirigir-se a um
cartório habilitado e solicitar a emissão de uma apostila para um
documento. Com a mudança, o prazo para legalização passou de meses para
apenas alguns minutos. “O apostilamento trouxe a desburocratização. O
processo, que era moroso, oneroso e concentrado em apenas poucas
cidades, agora é mais barato, fácil e está acessível em todas as
capitais e em várias cidades do interior”, afirmou o juiz Márcio
Evangelista.
De agosto de 2016 a abril de 2020, foram apostilados 5,2 milhões
documentos no Brasil. Somente em 2019, foram mais de 1,8 milhão de
documentos apostilados, com destaque para os estados de São Paulo, Santa
Catarina, Distrito Federal e Rio de Janeiro. Em 2020, com a publicação
do Provimento n. 106,
da Corregedoria Nacional de Justiça, o SEI Apostila foi substituído
pelo Sistema Eletrônico de Apostilamento (Apostil), desenvolvido pelo
CNJ e que despertou o interesse de outros países.
Em março de 2020, o conselheiro do CNJ Henrique Ávila representou o
Conselho no Council of General Affairs and Policy of the Hague
Conference on Private Internacional Law, na Haia, e confirmou o
prestígio brasileiro na implantação do apostilamento. “As delegações
estrangeiras ficaram muito impressionadas com o número de apostilamentos
que atingimos no Judiciário brasileiro. A verdade é que a nossa
experiência ao lidar com o vultosíssimo número de 80 milhões de
processos, jamais visto em qualquer lugar do mundo, nos dá também a expertise de desenvolver técnicas que os outros países ainda não têm”, afirma.
Combate à corrupção
Também foi em 2019 que os cartórios ingressaram na rede de
instituições envolvidas na prevenção e no combate à corrupção e à
lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo. O Provimento n. 88 da
Corregedoria Nacional determina que operações registradas em cartório
que levantem suspeita de lavagem de dinheiro e de financiamento do
terrorismo sejam comunicadas ao Conselho de Controle de Atividades
Financeiras (COAF).
A inclusão da atividade extrajudicial nesse combate era
imprescindível, já que, na maioria dos negócios realizados, os registros
públicos podem ser utilizados para dar aparência de legalidade a atos
ilícitos. O envio de informações ao COAF contribui para a elaboração de
relatórios de inteligência financeira mais precisos. Esses relatórios,
por sua vez, ficam à disposição dos órgãos de persecução penal, para uso
em investigações e ações penais instauradas contra os que praticam esse
tipo de crime: informações essas que, antes da regulação pela
Corregedoria Nacional, sequer chegavam ao conhecimento dos órgãos de
controle e de investigação nacionais.
A nova norma do CNJ foi um importante avanço no combate à corrupção
no Brasil e colocou os cartórios no mesmo patamar que seus pares
internacionais em países como França, Alemanha, Portugal, Itália e
Espanha.
A Corregedoria Nacional de Justiça atua como órgão responsável por
regular toda a atividade extrajudicial brasileira. Segundo o atual
corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, essa
normatização é de fundamental importância, uma vez que muitos desses
serviços devem ser oferecidos por todos os cartórios, nos mais distantes
rincões de nosso país. “O papel dos notários e registradores
brasileiros não se restringe apenas aos atos protocolares, mas assumem,
cada vez mais, uma posição de destaque na atividade econômica e social”,
afirma o ministro.
Exemplo claro das múltiplas áreas de atuação pode ser verificado com a
participação ativa de todos os notários e registradores brasileiros na
prevenção e combate à lavagem de dinheiro. “Com a edição do Provimento
n. 88/2019, da Corregedoria Nacional de Justiça, nós, definitivamente,
incluímos os cartórios brasileiros no protocolo internacional de
prevenção e combate à corrupção e a lavagem de dinheiro. Um ato
administrativo tão importante para o país que teve destaque na Convenção
das Nações Unidas contra a Corrupção (UNCAC), no ano de 2019”,
enfatizou o corregedor nacional.
Este texto faz parte da série comemorativa dos 15 anos do CNJ. Conheça aqui outros momentos dessa história
Acesse o hotsite comemorativo dos 15 anos do CNJ e saiba mais s24obre outras políticas judiciárias implementadas pelo órgão.
Paula Andrade
Agência CNJ de Notícias
Agência CNJ de Notícias
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