TRF-3ª – União deve indenizar paciente que desenvolveu reação alérgica a vacina contra gripe A (H1N1) em 2010
Para magistrados do TRF3, ficou provada a responsabilidade civil do Estado, mesmo na prática de atos lícitos
A União deve indenizar um portador de HIV que desenvolveu uma forte
reação alérgica, conhecida por Síndrome Steven Johnson, após participar
da campanha de vacinação contra a gripe A (H1N1) em 2010. Ao analisar os
recursos interpostos, os magistrados da Sexta Turma do TRF3 entenderam
que o Estado é responsável de forma objetiva, mesmo na prática de atos
lícitos, e também elevaram o valor da indenização concedida no primeiro
grau de R$ 50 mil para R$ 80 mil.
O autor da ação é portador do vírus HIV e imunodepressivo (sofre de
diminuição da função do sistema imunológico). Ele havia tomado a vacina
distribuída pelo Ministério da Saúde à rede pública na cidade de
Mirassol/SP e, logo em seguida, passou a sofrer graves sintomas da
Síndrome Steven Johnson, uma das reações possíveis à vacina.
Quando a situação se tornou mais grave, o autor da ação foi
encaminhado ao Hospital de Base, sofrendo dores intensas e descamação da
pele, o que deu origem a feridas de difícil cicatrização. Nesse
cenário, ele ingressou com o pedido de indenização, alegando ter
padecido de grave sofrimento moral devido à vacina, uma vez que seu
aspecto como pessoa foi alterado.
Em primeira instância, o pedido foi julgado procedente e reconhecido o
nexo de causalidade entre a aplicação da vacina providenciada pelo
Ministério da Saúde e o desenvolvimento da Síndrome Steven Johnson.
Em seu recurso contra a sentença, a União argumentou a ilegitimidade
para estar no polo passivo da ação e, subsidiariamente, a ausência de
causalidade entre a inoculação da vacina e o sofrimento do autor. A
alegação foi que, por ser ele portador do HIV, ele era pessoa
imunodepressiva e por isso mais suscetível a outras moléstias. O autor
da ação também apelou para que fosse elevado o valor da indenização.
Recurso
No TRF3, o relator do processo, desembargador federal Johonsom Di
Salvo, afirmou que não é possível acatar a ilegitimidade passiva da
União, uma vez que foi o Ministério da Saúde quem adquiriu dos
laboratórios a vacina contra a gripe e a distribuiu aos estados e
municípios.
“Se foi o Ministério da Saúde quem, no ano de 2010, comprou (da
Organização Pan Americana de Saúde/Opas, o laboratório britânico Glaxo
Smith Kline/GSK e do laboratório francês Sanofis-Pasteur) e distribuiu
as 83 milhões de doses da vacina contra a gripe A (H1N1), para serem
inoculadas na população, é óbvio que deve figurar como parte passiva em
ação promovida por uma das pessoas que recebeu a vacina e deseja
responsabilizar o Poder Público pela grave reação que seria consequência
da inoculação do medicamento”, pontuou.
O magistrado acrescentou entendimento consolidado do STF no sentido
de que a responsabilidade civil estatal se submete à teoria do risco
administrativo, tanto para as condutas estatais comissivas quanto paras
as omissivas, afastando a teoria do risco integral.
Johonsom Di Salvo também destacou a posição do Supremo de que o
Estado responde juridicamente também pela prática de atos lícitos,
quando deles decorrerem prejuízos para os particulares em condições de
desigualdade com os demais. No entanto, ressaltou que é sempre
necessário que o ato lícito tenha produzido um dano anormal e
específico, ou que esse dano seja ilegítimo. Segundo ele, é este o caso
do processo analisado.
“Que o autor sofreu sérios padecimentos de índole moral, logo após
ser inoculado com a vacina, não há o que discutir. Toda a prova
documental inserida nos autos – especialmente a declaração de médico do
serviço público – dá conta que o requerente foi acometido de Síndrome
Steven Johnson que nada tem a ver com a condição dele de portador de
HIV”, salientou.
Síndrome
Na decisão, o magistrado explica que a Síndrome Steven Johnson é uma
forma grave, às vezes fatal, que acomete a pele e as mucosas oral,
genital, anal e ocular; consiste em uma reação alérgica grave envolvendo
erupção cutânea nas mucosas, podendo ocorrer nos olhos, nariz, uretra,
vagina, trato gastrointestinal e trato respiratório, ocasionando
processos de necrose.
“Aponta-se como um dos fatores medicinais que desencadeiam essa
Síndrome de Steven Johnson a vacina contra o vírus H1N1 – que é feita de
vírus morto ou inativado e por isso não há risco do paciente
desenvolver gripe após a administração da mesma – sendo que este
Relator, em consulta a bula da vacina enquanto fornecida pelo
laboratório Sanofi-Aventis Farmacêutica Ltda, verificou que um dos
efeitos colaterais que podem ser provocados, ainda que raramente, é a
Síndrome de Steven Johnson”.
Segundo a decisão, não há dúvidas da efetiva relação de causalidade
entre a inoculação da vacina fornecida pelo Ministério da Saúde e a
Síndrome de Steven Johnson. Com esse entendimento, o magistrado
determinou que a União deve responder pelos malefícios sofridos pelo
autor em virtude de reação alérgica derivada da inoculação de uma vacina
que, para a imensa maioria dos inoculados, não trouxe qualquer
consequência ruim.
Por fim, acatou o recurso do autor é elevou o valor da indenização de R$ 50 mil para R$ 80 mil.
Apelação Cível 0000369-67.2012.4.03.6106/SP
Fonte: Tribunal Regional Federal da 3ª Região/AASP
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